sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Carta a um filho

Olá meu filho, estou escrevendo esta carta para quando tiveres capacidade de poder perceber e entender um bocadinho o mundo em que estiveste a crescer. Sim esta é uma carta para o futuro, um conceito muito frágil hoje em dia, e também por vezes negligenciado por um execesso de aqui e agora.

Sabe a mamãe estuda Sociologia, e nessa área do conhecimento há muito debate sobre as incríveis mudanças que vem ocorrendo no mundo hoje. Atenção, não se deixe enganar com o termo incrível, ele tem seus dois lados e também um meio. Enfim, hoje discute-se muitas coisas como o fim da história, exaltação do indivíduo, sociedades líquidas, quando antes tudo se desmanchava no ar. Há um clima que não há muito que se fazer, que o indivíduo está só e perdido em meio a uma imensidão de pessoas, poderes, informações, contra-informações, trabalho e falta dele. Há uma sensação generalizada de perda: perda de identidade, de referências, de chão, de humanidade, de comunidade, etc. Caos, impotência, falta de perspectiva. Hoje em dia reza-se a ladainha do salve-se quem puder, da forma que tiver, e isso é tido como corajoso e êxitoso.

São dias confusos meu filho, dias apáticos. Dizem que há muito tempo não há pessoas que pensem de facto propostas para a humanidade, propostas que não sejam como a que temos, pois o que temos é só guerra, destruição, morte, fome, tristeza.

Apesar de tentarem todos os dias e de todas as formas mais massacrantes nos empurrarem esse trágico legado, onde temos que nos resignar a um projecto de sobrevivência selvática, há sempre uma solução! Há sempre pessoas profundamente empenhadas em transformar essa situação para uma vida verdadeiramente digna e interessante. Se por acaso quando estiveres a ler este texto muita coisa não tiver mudado, pode ser porque a minha geração não tenha tido muitos êxitos nessa luta por um mundo melhor, no entanto isso não quer dizer que seja uma questão de derrota. Entenda filho, a vida é muito complexa e muito rara, e uma de suas belezas é poder vislumbrar coisas que estão por vir. Esse tipo de sonho estão querendo nos roubar, estão querendo nos roubar o futuro, que agora é seu presente, por isso não se trata aqui de questões geracionais de quem fez mais ou melhor e em que época para que as coisas melhorassem. Eu sou de um presente que fugiu completamente da realização de muitos sonhos antigos, sou de um presente de pesadelos, mas não é por isto estar assim agora que te podem tirar teu futuro.

Estamos juntos filho, hoje e amanhã, por todos, por ti, por nós, por acreditar que sempre podemos, que há uma possibilidade de humanidade, não só de salvamento dela. Precisamos nos salvar sim, mas sempre com proposta de sermos melhores.

Camila Lamarão

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