Em conversa com o post anterior da Andrea
Querida Andrea, gostava de partilhar contigo também o que penso sobre isto (e obrigada por nos convocares a reflectir sobre este tema....)
1. As guerras são temas dificílimos. Não só pela sua complexidade como também porque nos colocam perante o fio ténue que separa a vida da morte. Por mais verdade de la palice que isto pareça, acho que nunca é demais referi-lo. Não acho que existam guerras boas.
2. Temos uma cultura de guerra muito mais impregnada do que uma cultura de paz. Quando a paz existe é tomada como um dado adquirido e não se investe nela. Já a guerra, além de ser assumida como "natural", "inevitável" é constantemente construída como cultura, desde os media ao cinema ou até aos brinquedos para crianças. Por isso também, nos faltam soluções de paz ou ideias alternativas de construção de paz em situações complexas.
3. Com a ida ao Congo vi-me perante uma grande dificuldade em manter a clareza da minha posição relativamente à desmilitarização. Porque me apercebi, no concreto, da dificuldade que é dizer, por exemplo, àquelas mulheres que vivem continuamente sob a ameaça da violação, de perda das suas vidas e das pessoas que lhe são próximas, da destruição do seu país, que apoiarem o reforço do seu exército - corrupto, ele próprio violador, patriarcal, etc - era uma ridicularia. Porque senti que dizê-lo sem ter propostas específicas para elas se defenderem de outra forma, era uma barbaridade de quem não sabia o que era essa ameaça. E, de facto, apesar de algumas propostas de redes de defesa popular que existiam dos colectivos de mulheres de lá, não haviam soluções, nem imediatas nem a médio prazo. As únicas propostas construtivas que me pareceram evidentes eram o reforço daqueles colectivos, dos seus processos de organização, a visibilidade internacional das suas realidades e formas de luta (além do desmascarar das óbvias razões de interesse económico internacionais que mantinham aceso o conflito), bem como a continuidade do debate feminista internacional com participação de colectivos de mulheres a viver em zonas de conflito para construir propostas concretas, mesmo que essas propostas só com o tempo possam ir dando frutos.
4. Incomoda-me muito, neste caso, a rapidez com que a ONU (ONU? Países com veto? NATO? Os eternos interesses da indústria bélica?) prepararam e começaram a executar uma intervenção armada. Como se estivessem já à espera de uma maneira de conseguir entrar e controlar a zona, tão com cheiro de liberdade nos últimos tempos. Para além de não ver se, de facto, isso poderá terminar com a realidade de violência que a Líbia está a viver e com o poder do Kadhafi, ou se irá, bem pelo contrário, iniciar mais um longo processo de conflito continuado. Sempre me pareceu que bombas para ajudar a paz é um paradoxo demagógico desde há muito usado por países interessados em fazer a guerra por desejos de poder ou de dinheiro.
5. Posto isto, que fazer com a bola que fica presa na garganta ao ver o Khadafi a dizimar o povo da Líbia? Não sei. E é terrível essa impotência, claro. Apoiar de todas as formas que nos forem possíveis a capacidade do povo líbio manter a revolta, reforçar a sua luta, talvez seja por aí. Continuar a insistir na paz, a aprender a fazê-la. Até um dia a história começar a ser o contrário da que temos vivido.
1. As guerras são temas dificílimos. Não só pela sua complexidade como também porque nos colocam perante o fio ténue que separa a vida da morte. Por mais verdade de la palice que isto pareça, acho que nunca é demais referi-lo. Não acho que existam guerras boas.
2. Temos uma cultura de guerra muito mais impregnada do que uma cultura de paz. Quando a paz existe é tomada como um dado adquirido e não se investe nela. Já a guerra, além de ser assumida como "natural", "inevitável" é constantemente construída como cultura, desde os media ao cinema ou até aos brinquedos para crianças. Por isso também, nos faltam soluções de paz ou ideias alternativas de construção de paz em situações complexas.
3. Com a ida ao Congo vi-me perante uma grande dificuldade em manter a clareza da minha posição relativamente à desmilitarização. Porque me apercebi, no concreto, da dificuldade que é dizer, por exemplo, àquelas mulheres que vivem continuamente sob a ameaça da violação, de perda das suas vidas e das pessoas que lhe são próximas, da destruição do seu país, que apoiarem o reforço do seu exército - corrupto, ele próprio violador, patriarcal, etc - era uma ridicularia. Porque senti que dizê-lo sem ter propostas específicas para elas se defenderem de outra forma, era uma barbaridade de quem não sabia o que era essa ameaça. E, de facto, apesar de algumas propostas de redes de defesa popular que existiam dos colectivos de mulheres de lá, não haviam soluções, nem imediatas nem a médio prazo. As únicas propostas construtivas que me pareceram evidentes eram o reforço daqueles colectivos, dos seus processos de organização, a visibilidade internacional das suas realidades e formas de luta (além do desmascarar das óbvias razões de interesse económico internacionais que mantinham aceso o conflito), bem como a continuidade do debate feminista internacional com participação de colectivos de mulheres a viver em zonas de conflito para construir propostas concretas, mesmo que essas propostas só com o tempo possam ir dando frutos.
4. Incomoda-me muito, neste caso, a rapidez com que a ONU (ONU? Países com veto? NATO? Os eternos interesses da indústria bélica?) prepararam e começaram a executar uma intervenção armada. Como se estivessem já à espera de uma maneira de conseguir entrar e controlar a zona, tão com cheiro de liberdade nos últimos tempos. Para além de não ver se, de facto, isso poderá terminar com a realidade de violência que a Líbia está a viver e com o poder do Kadhafi, ou se irá, bem pelo contrário, iniciar mais um longo processo de conflito continuado. Sempre me pareceu que bombas para ajudar a paz é um paradoxo demagógico desde há muito usado por países interessados em fazer a guerra por desejos de poder ou de dinheiro.
5. Posto isto, que fazer com a bola que fica presa na garganta ao ver o Khadafi a dizimar o povo da Líbia? Não sei. E é terrível essa impotência, claro. Apoiar de todas as formas que nos forem possíveis a capacidade do povo líbio manter a revolta, reforçar a sua luta, talvez seja por aí. Continuar a insistir na paz, a aprender a fazê-la. Até um dia a história começar a ser o contrário da que temos vivido.
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